Direto da Sacristia
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Guia litúrgico para o Jubileu da Misericórdia

Postado em 14 novembro 2015por E. Marçal

Apresentação dos ritos do Jubileu da Misericórdia
e do livro litúrgico do Direto da Sacristia

 

O motivo dos Jubileus

Os Jubileus foram inspirados no jubileu judaico, um descanso para os trabalhos do campo após seis anos consecutivos de atividades. Mas também, após 7 jubileus a cada 7 anos, o 50º ano também era Jubileu. Portanto, após 49 anos de um jubileu, no ano seguinte um outro Jubileu era celebrado. Era uma comemoração e também tendo de perdão até mesmo de dívidas entre pessoas e troca de ajudas caritativas materiais.

O início dos Jubileus na Igreja e a sua frequência inicial

A Igreja inspirou-se nisso. O Papa Bonifácio VIII convocou em 1300 o primeiro Jubileu, para que fiéis acorressem para Roma e venerassem a relíquia do véu de Verônica, como aconteceu. Os frutos espirituais dessa celebração fizeram com que o mesmo Papa determinasse que aquilo acontecesse a cada 100 anos. Contudo, já em 1350, o quinto Papa depois de Bonifácio VIII, Clemente VI, estava fora de Roma, exilado em Avinhão (França) pelo rei Filipe IV porque o Pontífice o proibira de cobrar tributos da Igreja na França. Como forma de compensar a sua ausência em Roma e ser paralelo ao jubileu bíblico-hebraico, de Avinhão Clemente VI decretou que em 1350 fosse celebrado o segundo Jubileu da história, reduzindo para 50 anos o espaço entre um e outro Jubileu. E este foi o primeiro extraordinário.

As práticas devocionais durante os Jubileus

Os fiéis visitavam o túmulo de São Pedro, na Basílica no Vaticano. Portanto, desde o começo, houve essa disciplina de que o Jubileu pediria esforços físicos, peregrinações e orações para perdoar os efeitos temporais do pecado. Com o Jubileu de 1350, sem um Papa em Roma mas em Avinhão, a Basílica-Catedral do Latrão foi adicionada ao roteiro de peregrinação. Quarenta anos depois, Bonifácio IX proclamou um Jubileu extraordinário porque o Cisma do Ocidente (que deu origem à Igreja Ortodoxa) atrapalhara a sequência de anos e incluiu também a Basílica de Santa Maria Maior como destino dos peregrinos como forma de perdoar as penas dos pecados. Por fim, para respeitar o período de 50 anos entre os Jubileus, o mesmo Bonifácio IX convocou um novo em 1400 e incluiu também no roteiro de peregrinação a Basílica de São Lourenço Fora-dos-Muros (muito mais importante até antes do Vaticano II), a Basílica de Nossa Senhora no Trastevere e a Basílica de Nossa Senhora dos Mártires (o Panteão).

A nova frequência para os Jubileus

Em 1475, o periocidade entre os Jubileus foi reduzida para 25 anos, a fim de que mais pessoas pudessem participar deles, e essas celebrações receberam também o nome de Anos Santos. A invenção da imprensa ajudou a divulgar as primeiras orações que passaram a ser requeridas junto às práticas e às peregrinações em vista dos bens espirituais dos Jubileus.

A Porta Santa do Vaticano como a primeira

Em 1500, quando como Papa reinava Alexandre VI, foi determinado por ele que a primeira Porta Santa a ser aberta, inaugurando um Jubileu, fosse a da Basílica de São Pedro e não mais a da Arquibasílica do Latrão. Depois, seguir-se-iam a abertura das Portas Santas das outras 3 Basílicas Maiores de Roma.

Por que o símbolo da Porta, teológica e praticamente

O costume da Porta Santa surgiu tanto porque o próprio Cristo disse “Eu Sou a porta” e “ninguém vai ao Pai senão por mim”, porque “Eu Sou o caminho, a verdade e a vida”. Também a este costume aplicam-se as palavras do salmista “Esta é a porta do Senhor; por ela entram apenas os justos” (Sl 118, 20).

Mas por que uma porta? Porque o imperador Constantino (século IV) decretou que seria concedido o perdão aos criminosos do Estado quem se refugiasse na Basílica de São Pedro numa época previamente estabelecida. Contudo, passaram a abusar dessa medida graciosa, a ponto de a Igreja ter que internamente fechar a porta com um muro, cuja demolição esteve presente nos ritos de abertura de Jubileu até o de 1975. A Porta Santa da Basílica de São Pedro, à direita de quem entra, era uma porta de serviço, ainda na Basílica constantiniana, demolida no início de 1500. Primeiro era de madeira e depois passou a ser de metal, como bronze, ornada com imagens sagradas e significativas ao sentido teológico de seu contexto no Jubileu.

O rito nas dioceses

A novidade nas dioceses deste Jubileu

Pela primeira vez, o Jubileu terá celebrações simbólicas pelas dioceses: o Papa Francisco abrirá a Porta Santa da Basílica de São Pedro no dia 08 de dezembro próximo, Solenidade da Imaculada Conceição, e determinou que as dioceses realizassem um rito semelhante no domingo seguinte, 3º do Advento (Gaudete). Desta forma, os fiéis de todo o mundo participarão de alguma forma, ainda que simbólica, da abertura do Jubileu da Misericórdia, embora há várias décadas não só em Roma os fiéis podem se beneficiar dos frutos espirituais dos Anos Santos.

Lacre nas Portas das Catedrais e outras igrejas

As Portas Santas das dioceses será algo extraordinário e não como as já existentes nas Basílicas Maiores de Roma, à direita da porta principal. Sugere-se que sejam ornadas com ramos abundantes ou outras decorações litúrgica e teologicamente adequadas. Sendo assim, para maior significado, é muito conveniente que as portas principais das igrejas escolhidas nas dioceses sejam lacradas, para que a solene abertura (ou bênção, não se tratando da porta da Catedral) adquira caráter semelhante à abertura das Portas Santas de Roma.

Rito próprio aprovado e publicado

         Para tanto, o Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização (responsável pelo Jubileu) publicou um rito feito por liturgistas e devidamente aprovado pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Ambos os atos, portanto, têm a ação do Papa, para os devidos efeitos oficiais e legais.

O rito no Brasil e sua publicação

         O rito demorou muito para ser publicado; somente em outubro passado, há cerca de 1 mês. Primeiro em italiano. Depois surgiu a edição em Portugal e, agora, já está em processo para a aquisição no Brasil. Tudo isso pela Paulus Editora. O rito deveria ter sido disponibilizado há mais tempo, para o devido preparo pelo mundo, mas os trabalhos anteriores ao Sínodo dos Bispos e durante atrasaram o processo na Cúria Romana. Além disso, a edição publicada pela Paulus em todos os países onde está disponível é em formato de subsídio, de fascículos numa coleção de 8 unidades. Por isso que foi indicado pelos liturgistas que as dioceses adequadamente adaptassem o conteúdo para o formato litúrgico, de modo que fosse um livro digno para o uso na Liturgia, tais como os que já são publicados e usados oficialmente.

A estrutura do rito

O dia nas dioceses

Pela bula Misericordiae Vultus, do Papa Francisco, pela qual foi anunciado e convocado o Jubileu da Misericórdia, definiram-se as catedrais, santuários e outras igrejas importantes como lugares referenciais para o Ano Santo nas dioceses. Assim, há 2 ritos de abertura do Jubileu: o presidido pelo Bispo na Catedral ou na Concatedral e o presidido por um delegado episcopal nas outras igrejas escolhidas pelo Bispo. Por fim, também foi publicado um rito para a conclusão diocesana do Jubileu, em 13 de novembro de 2016.

O rito presidido pelo Bispo em sua Catedral

A statio

O rito recupera o antigo costume das estações romanas, statio, cuja referência podemos ver no Missal Romano do rito antigo, das quais um exemplo ainda atualmente praticado pelo Papa e pela Cúria Romana é a da Quarta-feira de Cinzas: a statio na Basílica de Santa Sabina. No resto do mundo, também podemos chamar de missa estacional as da Apresentação do Senhor, do Domingo de Ramos e da Vigília Pascal, que começam fora da igreja principal (a da “estação”) e para ela se dirigem.

O significado de statio

O termo “estação” tem origem militar, significando “guarda”, mas a Igreja encontra uma aplicação cristã no II século, no livro O Pastor de Hermas, significando jejum. Ainda hoje nos referimos a dias santos, ou por práticas de jejum ou por sua solenidade, como “dias de guarda”.

A statio no início da Igreja

Nos primeiros séculos, principalmente em Roma, as missas estacionais eram mais comuns a ponto de serem regra: os fiéis se reuniam em outra igreja ou outro lugar, no qual a Missa era iniciada, e depois clero e povo saíam em procissão para a igreja principal (a da “estação”), cantando a Ladainha dos Santos. Chegados à igreja, todos repetiam o Kyrie eleison 3 vezes, que tinha sido a resposta durante a procissão, no canto da Ladainha. Assim, hoje resultou o ato penitencial, ainda nele incluso o Kyrie eleison.

Resquícios hoje

O novo Cerimonial dos Bispos renomeou a Missa mais solene celebrada pelo Bispo: agora voltou a chamar-se de Missa estacional, embora nem sempre tenha a procissão da qual falamos há pouco.

O rito no 3º Domingo do Advento

Portanto, o rito de abertura do Jubileu nas dioceses pede que a Missa celebrada pelo Bispo comece numa outra igreja cujo percurso até catedral permita uma verdadeira procissão. Na primeira igreja, todos os ministros ordenados já devem estar paramentados com vestes de cor roxa (ou rósea, conforme permite o III Domingo do Advento): sugere-se que o Bispo Celebrante use pluvial, reservando a casula para após a procissão. Aqui ele começará a Missa, haverá proclamação do Evangelho com os ritos solenes próprios, leitura de um trecho específico da bula de convocação do Jubileu e a respectiva procissão. Durante esta, o diácono porta com grande destaque o Livro dos Evangelhos, enquanto todos assumem o seu devido lugar e cantam salmos indicados ou até mesmo a Ladainha dos Santos. Na procissão é usado incenso, abençoado pelo Bispo.

Diante da Porta Santa da Catedral, todos param e reservam um espaço conveniente para os ministros do serviço litúrgico, o diácono com a cruz processional, o diácono com o Evangeliário e o Bispo. São simples, mas de particular beleza e total explicação teológica os versos que o Bispo recitará diante da Porta fechada:

         Abri-me as portas da justiça, quero entrar para dar graças ao Senhor!
      Aperite mihi portas iustitiae; ingressus in eas confitebor Domino. (do Salmo 118)

Convém que ministros estejam desde antes dentro da catedral e a abram enquanto o Bispo diz o seguinte:

“Esta é a porta do Senhor: por ela entraremos para alcançar misericórdia e perdão”. Verso também inspirado no versículo 20 do mesmo Salmo 118, mas com uma modificação no original: não se diz que por esta porta somente os justos (santos, em estado de graça), entrarão.

Após isso, o Bispo recebe o Livro dos Evangelhos e o mostra ao povo, mas sem com ele abençoá-lo. Nisso, todos cantam a antífona do Evangelho de João: “Eu sou a porta. Quem entrar por mim, será salvo; entrará e sairá e encontrará pastagem”. Concluído o canto, forma-se novamente a procissão e ela parte para o altar da Catedral, porém, o Bispo portará o Livro dos Evangelhos logo depois dos ministros com as velas; atrás dele seguirão os demais ministros auxiliares, o clero e o povo, lembrando um pouco a procissão de entrada com o Círio na Vigília Pascal.

Chegado ao altar, o Bispo coloca sobre ele o Evangeliário e, se tiver usado pluvial, de modo discreto e reverente o troca pela casula; beija o altar, põe novo incenso e o turifica. O ato penitencial deverá ser sob aspersão, para o que é prevista a fórmula de bênção da água e adição do sal abençoado, conforme o rito, se assim for decidido.

A Missa segue o seu curso normal, sem o canto do Glória, em razão das rubricas do Advento. Antes da bênção final, porém, são comunicadas as outras igrejas que terão a Porta da Misericórdia e é cantada ou a Salve Rainha ou a Alma Redemptoris Mater, antífona mariana própria do Tempo do Advento. A seguir, o Bispo abençoa segundo o texto próprio para o Tempo litúrgico.

O rito presidido por um delegado episcopal

A diferença do rito episcopal

Nesta forma o rito é simplificado em relação ao anterior, tanto para evitar a importância da Porta Santa na Catedral quanto para destacar que só uma abertura de Porta Santa na diocese, aquela que foi feita pelo Bispo. Não há procissão de outra igreja e nem o mesmo rito diante da porta principal da igreja.

Nas outras igrejas e santuários, o rito pode ser presidido ou pelo próprio Bispo ou por um estreito colaborador seu no serviço da diocese.

Os ministros ordenados paramentam-se com vestes roxas ou róseas. Depois, eles e os demais ministros auxiliares formam a procissão e caminham até diante da porta principal da igreja, fechada, inicia a Missa, pronuncia uma oração laudatória e depois abençoa a porta. Note-se, portanto, que não é uma abertura solene de Porta Santa, mas a bênção da porta principal das igrejas escolhidas como pontos de peregrinação diocesana para o Jubileu da Misericórdia.

Após isso, convida a todos para serem aspergidos, o que é feito pelo Celebrante enquanto caminha no fim da procissão para o altar, segundo o costume da Missa solene, o inclusive com o turíbulo fumegando.

Chegado ao presbitério, se o Celebrante tiver usado pluvial, troca-o pela casula, beija o altar e o incensa. Em seguida, pronuncia a absolvição do ato penitencial e, omitindo o canto do Glória, recita a oração Coleta do III Domingo do Advento.

A Missa segue o curso normal, inclusive com a bênção solene para o Tempo do Advento.

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