Direto da Sacristia
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Solenes exéquias do Cardeal Martini

Postado em 03 setembro 2012por E. Marçal

Discussões ante e post mortem

A Igreja ambrosiana se prepara para sepultar um dos mais conhecidos pastores que se sentou em seu cátedra. O Cardeal Martini soube se inscrever não apenas na história de Milão, mas também na da Igreja inteira como um dos maiores exegetas do seu tempo, reitor de duas instituições de estudo eclesiásticas renomadas e um teólogo de caráter progressista, mas que apresentava embasados motivos, embora descreditados desde o início por se oporem à doutrina oficial, para as suas ideias. Contudo, como um grande intelectual, atraía a atenção para os seus posicionamentos porque eles eram fruto de seu profundo estudo exegético e não simples apologia remetida num pacote de uma ideologia. Não se limitou em criticar até mesmo a trilogia “Jesus de Nazaré”, de autoria do Papa Bento XVI, teólogo como ele, mas cujo pensamento supera em fama o do Cardeal.

Suas objeções teológicas também passaram em sua recusa que o início da vida humana esteja na penetração do espermatozoide no óvulo – que consente, assim, as pesquisas com óvulos fecundados, como também a interrupção da gravidez; e foi mais um defensor da união homoafetiva como modo estável para a condição moral de ambos – sem, contudo, desenhar como “modelo” a união homossexual e reconhecendo as motivações para o matrimônio tradicional, mas sim uma resposta às necessidades das pessoas em sua humanidade. Enfim, o Cardeal Martini desejava usar seu conhecimento exegético para um diálogo com o mundo também não-crente, a fim de dar as razões da fé cristã.

Envolto em discussões durante a sua vida, podemos pensar que elas também não cessaram depois de sua morte. Sim, pois, às vésperas de seu sepultamento, jornais italianos polemizaram a sua escolha em não mais se submeter a intervenções médicas em razão do agravamento do Mal de Parkinson do qual padecia. Recusou nestes últimos tempos; já havia sindo hospitalizado antes. Contudo, não foi um covarde e anticristão rendimento à saúde, mas sim, ainda totalmente consciente, optou por não ser mantido vivo graças a tratamentos agressivos, como o que lhe introduzia uma sonda para sua alimentação, uma vez que em sua última crise estava já impossibilitado de ingerir alimentos tanto sólidos quanto líquidos. Pronunciamentos esclarecedores e em defesa da escolha cristã de Martini foram feitos pelo Cardeal Scola, quando acolheu o corpo de seu predecessor na Duomo de Milão, como também por seu confrade Pe. Federico Lombardi, porta-voz da Santa Sé, e pelo Rev.do Mons. Roberto Colombo, professor da Faculdade de Medicina do Hospital Gemelli de Roma.

Provavelmente esta foto mostra o último encontro entre o Pontífice e o Cardeal Martini
ocorrido em junho passado, em Milão

Não se tratou, no fim das contas, de uma eutanásia desejada pelo próprio cardeal enfermo, mas sim de uma recusa à obstinação terapêutica (Catecismo da Igreja Católica, 2278).

Funerais e exéquias

O Cardeal Angelo Scola, Arcebispo de Milão, celebra exéquias solenes desde as 16h (horário local), 11h no Brasil. O Santo Padre Bento XVI é representado e tem uma mensagem sua lida no início da Santa Missa por seu Legado o Cardeal Angelo Comastri, vigário para a Cidade do Vaticano e Arcipreste da Basílica Vaticana. Inúmeras autoridades civis presenciam a cerimônia, entre elas o Prof. Mario Monti, primeiro-minitro italiano. Ao fim da função litúrgica – oficiada em paramentos roxos -, o Cardeal Tettamanzi, imediato sucessor do Cardeal Martini e hoje arcebispo emérito, faz um pronunciamento. Lembramos que possuindo um rito litúrgico próprio, a cerimônia pode conter particularidades inerentes aos livros ambrosianos.

Nos três dias de câmara ardente, onde o corpo do cardeal esteve exposto à visitação, 200 mil pessoas passaram pela Duomo para se despedir do jesuíta, segundo os dados fornecidos pela Cúria. A Santa Missa, que reuniu cerca de 6 mil pessoas dentro da Catedral e 15 mil fora dela – que acompanharam a cerimônia por meio de telões -, foi assistida também por cerca de 12 cardeais e 38 bispos, 1.200 sacerdotes, 4 ministros civis, 30 parlamentares e 35 prefeitos, além de comitivas budistas e muçulmanos, ortodoxos e coptas. Em sua mensagem, lida por seu Legado o Cardeal Comastri, o Papa Bento XVI disse que Martini “era um homem de Deus, que não só estudou a Bíblia, mas que amava intensamente. […] Foi capaz de ensinar aos crentes e àqueles que estão buscando a verdade, que a única palavra digna de ser escutada, aceita e seguida é a de Deus, porque mostra todo o caminho da verdade e do amor”.

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Ao fim de sua homilia, o Cardeal-arcebispo de Milão Angelo Scola rezou: “Caro Arcebispo Carlo Maria, a Virgem Maria da Assunção, com os Anjos e Santos, que acorrem a nossa Catedral, o acompanhem ao seu destino que almejava: ver a Deus face a face. Amém”.

O corpo do Cardeal foi sepultado numa capela à direita da Catedral, no altar da Cruz de São Carlos Borromeu.

Abaixo, o vídeo da Santa Missa exequial:

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