Direto da Sacristia
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“Factus oboediens usque ad mortem”

Postado em 03 setembro 2010por E. Marçal


Confiteor
Entre as promessas que os ordenandos fazem ao Bispo na cerimônias das sagradas ordenações e os votos que os religiosos professam na cerimônia de suas profissões solenes, encontra-se a obediência. Tal como Cristo o foi, a Igreja, seus ministros e membros de institutos religiosos são chamados a serem obedientes na fé, assim como todos os fiéis católicos. Todos os outros encargos inerentes à responsabilidade do estado de cada um deles, dependem da configuração da própria vontade à vontade do superior eclesiástico. Não obstante, não poucos exemplos testemunhamos de como muitos superiores eclesiásticos desviam seus súditos da reta intenção e os fazem, em virtude da subordinação, se perderem em caminhos não tão ortodoxos.

A virtude da obediência 

Et erat subditus illis
“E era-lhes obediente”

Do Evangelho de Lucas II, 51

“Prometes respeito e obediência a mim e aos meus sucessores?”
“Prometo”
“Deus, que te inspirou este bom propósito, te conduza sempre mais à perfeição”.
(Pontifical Romano, Rito da ordenação de Bispos, Presbíteros e Diáconos)

As Sagradas Páginas dos Evangelhos escrevem que o Divino Redentor, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, era obediente aos seus pais. Ele, Deus onipotente e criador de tudo, subordinou-Se às criaturas. Do mesmo modo, foi fiel à missão a que foi enviado, que culminou no Calvário:

Humiliavit semetipsum factus oboediens usque ad mortem, mortem autem crucis
“Humilhou-Se a Si mesmo e Se fez obediente até a morte,morte de cruz”

Da Carta de São Paulo aos Filipenses II, 8b

 

Para tanto, aqueles que foram ordenados ao sacerdócio ministerial e/ou que professaram os conselhos evangélicos em um instituto religioso, em virtude de seu estado, são chamados à irrestrita obediência às indicações dos seus superiores, desde que estas não se oponham aos mandamentos divinos. Eis o detalhe que faz tanta diferença: os súditos do clero regular ou do clero secular são submetidos às ordens dos seus superiores, quando estas não são contrárias à consciência individual e a lei de Deus.

“É a obediência, e ela só, que nos indica a vontade de Deus com evidência.
O superior pode errar, mas não é possível que nós, ao seguirmos a obediência, sejamos levados ao erro. Só poderia haver uma exceção se o superior
mandasse algo que incluísse – mesmo em grau mínimo –
uma violação da lei divina; pois, neste caso,
o superior não seria fiel intérprete de Deus”.
São Maximiliano Maria Kolbe

Lamentavelmente, muitos ordinários interpretaram o Concílio Vaticano II não concorde com a intenção dos Pontífices e levaram o rebanho a eles confiados ao erro doutrino-teológico. Pensaram que a veste talar era incompatível com a missão pastoral, por isso, aboliram-na. Quanto à doutrina universal da Igreja: julgaram-na importuna com a realidade dos povos distantes de Roma; consequentemente, deram-se ao direito de, usurpando o dever do Romano Pontífice, ditarem eles mesmos uma teologia às ovelhas do rebanho de Cristo. E o cúmulo: romperam com a fiel interpretação das Escrituras e uniram à esta conceitos políticos e humanos, a ponto até de retirar o caráter divino do Redentor e reduzi-Lo a um subversivo judeu. Isso foi iniciado a quase meio século, e hoje, mesmo em um contexto diferente daquele onde surgiram tais erros, continuamos a ver os nefastos frutos de tudo isso.

Em uma missa rezada por membros de uma ordem religiosa, vários sacerdotes professos concelebrariam em número ímpar com o provincial. Contudo, este achou que ficaria sem “simetria” um lado do presbitério conter um número diferente do do outro lado. Aplicou uma solução: paramentou um religioso de votos simples como um sacerdote concelebrante (alva e estola) e o colocou no altar. O noviço, não querendo desobedecer às ordens do seu provincial e temendo uma correção, obedeceu imediatamente. E a missa aconteceu. Passados os anos, aquele noviço seria ordenado presbítero, mas, um irmão seu de hábito apresentou ao novo provincial uma fotografia da missa que ele teria “concelebrado”. Como trata-se de um impedimento para a sagrada ordenação a tentativa de um leigo celebrar os Divinos Mistérios, foi explicado que o então noviço cometeu tal delito por ordem do provincial da época, sobre quem recaiu – com justiça – a culpa. Este foi um exemplo do que muitos superiores levam seus subordinados a fazer. Contudo, aqueles não têm toda a culpa. Os que cometem algum erro – levado pela linha teológica que suas ordens assumiram – certamente não desconhecem a verdade. Se desconhecem, então ignoram a legislação canônica – o que é mais grave, já que foram ordenados ao ministério sacerdotal sem possuírem os requisitos intelectuais e a formação acadêmica exigidos. Sem sombra de dúvida, muitos assumem uma postura doutrino-teológica estranha à da Igreja por medo de sofrerem com isso, de serem considerados estranhos à sua realidade, ao seu clero – seja este regular ou secular. Com isso, os pressupostos assumidos há tantos anos e agora visivelmente confrontados com o sagrado Magistério e refutados como conteúdo estranho à fé católica, são perpetuados. Mesmo o Senhor tendo chamado a Si tantos ordinários – de institutos religiosos ou de dioceses – ou eles não exercerem mais atualmente o mesmo cargo de antes, a semente que eles plantaram agora pode ser, infelizmente, vista como uma árvore frondosa, repleta de frutos, com milhares de comensais deleitando-se à sua sombra.

Nem tudo são lamentos. Existem, mesmo que poucos diante do surpreendente número contrário, muitos sacerdotes seculares e professos de institutos religiosos que aderem ao correto ensinamento da santa Igreja e dos Pontífices e exercem fielmente o sacerdócio ministerial a que foram ordenados. Já conhecemos sacerdotes seculares que celebram segundo o Missal de João XXIII – como o Instituto Bom Pastor e a Administração Apostólica São João Maria Vianney; mas, com o passar dos dias, apresentaremos religiosos que formaram um novo ramo de suas ordens e aderiram exclusivamente à celebração da Santa Missa na forma extraordinária. Não que apenas assim eles são fiéis à Igreja. Não. Conhecemos a Prelazia da Santa Cruz e Opus Dei e outras realidades magníficas de fidelidade ao depósito da fé, que não usam apenas uma forma da celebração da Missa e que também executam os ensinamentos da religião. Contudo, é realmente surpreendente tais religiosos que, conservando as mesmas tradições de outros confrades seus – descobriram na Liturgia de Pio V e suas reformas, um precioso tesouro da tradição católica e nele – e dele – querem viver, sem nenhuma oposição aos documentos do Concílio Vaticano II.

Se São João Maria Vianney diz que “nenhum padre, ao céu ou ao inferno, vai sozinho”, imagino o que pode acontecer aos superiores que conduzem ao erro tantos que lhes são subordinados e que, salvo exceções, os praticam em virtude da obediência…

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