Direto da Sacristia
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Quia bene canta, bis ora

Postado em 31 agosto 2010por E. Marçal
A beleza do canto religioso em uníssono ao louvor dos anjos e santos, de toda a Igreja glorificada no céu. Não se trata de qualquer canto, mas aquele que contenha a mesma doutrina que encerram as Escrituras, e que seja a demonstração sincera e fiel do sentimento e da oração dos cristãos.

Texto do seminarista Carlos Donato, da Arquidiocese da Paraíba.


O canto litúrgico

“Eis pois, diante de Vós todos os anjos
que vos servem e glorificam sem cessar, contemplando a vossa glória.
Com eles, também nós, por nossa voz, tudo o que criastes,
celebramos o vosso nome, cantando a uma só voz”.
Prefácio da Oração Eucarístia IV

Post haec vidi: et ecce turba magna, quam dinumerare nemo poterat, ex omnibus gentibus et tribubus et populis et linguis stantes ante thronum et in conspectu Agni, amicti stolis albis, et palmae in manibus eorum; et clamant voce magna dicentes:
« Salus Deo nostro, qui sedet super thronum, et Agno ».

Depois disto vi uma grande multidão, que ninguém podia contar:
gente de todas as nações, tribos, povos e línguas.
Estavam todos de pé diante do trono e diante do Cordeiro.
Vestiam vestes brancas e traziam palmas na mão.
Em alta voz, a multidão proclamava:
«A salvação pertence ao nosso Deus,
que está sentado no trono, e ao Cordeiro».

Do livro do Apocalipse de S. João 7, 9-10

Hoje gostaria de propor à nossa reflexão semanal sobre o Culto Divino, o tema do canto litúrgico, que, graças a Deus no Brasil está indo bem com o hinário da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que com letra bíblica, melodia fácil e harmonia entre fé e métrica colocou nas mãos do nossos fiéis uma verdadeira obra de arte que deve ser admirada, aprendida e cantada.

Na Liturgia, a Igreja ordena que o louvor da Hierarquia e dos fiéis
una-se às vozes dos anjos e dos santos.

Sabemos todos que o canto litúrgico é uma antecipação do canto dos remidos, cuja referência fizemos no inìcio deste artigo. É o canto da Igreja que, redimida no sangue do seu Esposo, O exalta, O suplica e O louva. Podemos dizer que é a voz do Espírito no meio dos fiéis reunidos em nome de Cristo. A beleza do canto litúrgico deve levar esta assembléia congregada a expressar tangivelmente a alegria da Jerusalém do céu – meta de nosso peregrinar neste “vale de lágrimas”.



Santo Agostinho dizia que quem canta bem reza duas vezes: “Quia bene canta, bis ora”. É uma verdade o pensamento do Doutor da Graça, pois o canto deve ser digno do fim para o qual é usado; deve envolver e levar-nos livremente ao encontro do mistério que cantando celebramos. É belo ouvir o diálogo entre o Celebrante e a assembléia litúrgica alternado-se em canto. É digno sentir vibrar as paredes do templo, sinal de que vibra com o canto a rocha do nosso coração, que, com a graça de Deus, se tornaram semelhantes ao do seu Filho.


O canto litúrgico, porém, é diferente do canto catequético, do religioso, do popular. Ele possui as prerrogativas que declinaremos a seguir:


Primeira. Deve ter letra bíblia ou inspiração bíblica. A letra deve fazer ressoar em nossos lábios aquilo que ouvimos da palavra de Deus proclamada e ensinada na Igreja, uma continuação do mistério de Cristo, meditado por ocasião da liturgia celebrada.

Segunda. Melodia fácil de ser cantada pela assembléia litúrgica. Isto significa que a assembléia não está congregada para um concerto, mas para celebrar Cristo, portanto tem o direito de cantar ao seu Senhor que está presente em seu meio, seja pela palavra, seja pela eucaristia.

Terceira. Tenha sido feito para fins litúrgicos. Usar de melodias não-religiosas existentes para a função litúrgica, que recordarão de muitos fatos, menos do louvor de Deus. Canto litúrgico é fruto de uma experiência de fé vivida em oração com a comunidade dos orantes.


Anjos ápteros (sem asas), com ricos paramentos,
cantando enquanto oficiam a Liturgia

Como é belo ouvir a comunidade reunida em torno do seu Senhor, convocada pelo Eterno Pai, em nome do seu Filho e na ação do Espírito de Amor. Sentir a harmonia dos corações envolvidos no mesmo sentimento, como nos primórdios de nossa santa religião – onde um só coração e uma só alma eram os cristãos. Contudo, harmonia e sentimento não significam sentimentalismo, fé abstrata, êxtases e tantos outros fenômenos que vemos em nosso tempo hodierno, mas saber o que se celebra, porque o fazemos e como o fazemos por meio do canto litúrgico.

Coro da Capela Pontifícia Musical Sistina
Vozes masculinas que elevam o espírito na Liturgia
durante as cerimônias no Vaticano

Mais uma vez convido a conhecer o hinário litúrgico da Conferência dos Bispos brasileiros, uma das poucas conferências episcopais que conseguiu realizar uma obra colossal – reunir em um livro em fascículos uma gama de bons cantos e que nasceram da experiência com o Ressuscitado, atuante em nossas comunidades. Com este belo e precioso instrumento podemos render bela e sacra liturgia, cantando ao Senhor um louvor perene, por meio do cântico novo que brota do coração dos remidos.

Carlos Donato é seminarista da Arquidiocese da Paraíba
Residente no Seminário Internacional Sedes Sapientia
da Prelazia da Santa Cruz e Opus Dei, Roma
Acadêmico de Teologia da
Pontificia Università della Santa Croce
Correspondente e autor de artigos do blog

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